Fui visitar o meu túmulo. Onde quero estar pra sempre. Adubando raiz de bromélias, de um verde forte e um grená reluzente. Me misturar na areia branca, nesse ambiente macio e quente. Me refrescar com orvalho da noite e de manhã acordar com sol nascente.
O surf, desde criança, foi uma paixão muito forte na minha vida. Eu era tijucano e pra minha mãe surf era um esporte perigosíssimo além de ser coisa de playboy maconheiro da zona sul. Eu adorava o perigo, o estilo e, é claro, a maconha. Ela cortou meu barato. Me dizia, não é não!
Saí de casa e comprei minha primeira prancha. Fins de semana na praia, tentando aprender sozinho. Acabou que o tempo passou, comecei a ter filhos, fui pra serra e pro exterior. O surf ficou adormecido por um tempo, mas eu nunca deixei de viver aquele estilo de vida. Mesmo sem surfar com muita frequência.
Meus filhos cresceram e fui morar na praia. Se apaixonaram pelo surf e vivemos muitos anos surfando os picos do Rio, viajando e vivendo momentos inesquecíveis, em dias clássicos e em muitos perrengues. O importante era voltar pra areia, encontrar todo mundo, curtira a vibe e planejar o dia seguinte. Até hoje meu filho me leva pra surfar aí pelo mundo. Ele também curte a vibe.

A praia é um ambiente mágico. O sol, o céu azul, o verde do mar, a areia branca, as ondas e o vento, são todos como se fossem uma só energia. Aí começa a brotar vidas. Gente correndo, surfistas alongando, meninas arrumando o cabelo, o biquíni e a festa rola mesmo é dentro d’água.
Vem a série começa a remação, gritaria. – Alô! Alô! Alô! Os moleques e as minas apertam na braçada, o vento joga água na cara e, finalmente, um dropa a onda! Sentir o empuxo, subir, olhar de cima e ver tudo em flashes passar. Deslizar, fluir, derramar a adrenalina, na busca do quase flutuar. E isso tudo não termina, com um mergulho e um grito no ar. A gente respira e volta pra cima, como criança que nunca para de brincar.
E a onda é um palco. Tem sempre uma plateia na areia pra ver você se exibir com alegria. Os caras mandam os aéreos e as minas bailam pela longarina até pendurar os dedinhos, lá no bico, lá na quina. E tudo isso se integra, numa harmoniosa forma de energia.
Vivo assim e assim vou viver pra sempre. Vou minhas cinzas derramar, naquele jardim de restinga, para as bromélias adubar. Vou exalar energia, ar fresco e aquele grená. Toda a beleza ambiente, sob o sol, o verde e o azul do mar.
“Aqui jaz um surfista. Que aqui viveu com alegria. E vai estar aqui pra sempre, nesta singela forma de energia”
Rio de Janeiro, 12 de fevereiro de 2021.
André Guimarães.